Há cerca de 40 dias, o engenheiro de produção Marco Aurélio Fernandes ficou inconformado ao assistir noticiários sobre a falta de equipamentos nos hospitais do mundo todo para tratar os pacientes contaminados pela Covid-19 - e até imagens de médicos sem outra opção, colocando pacientes dentro de sacos plásticos na tentativa mal sucedida de aumentar a pressão de oxigênio. Engenheiro responsável por uma empresa especializada na manutenção de Equipamentos de Proteção Respiratória (EPRs), ele decidiu adaptar, para aplicação hospitalar, três tipos de máscaras utilizadas por bombeiros/ brigadistas no controle de emergências, quando ocorrem vazamentos com produtos químicos perigosos.
“Estava em Portugal no início de março quando recebi de um bombeiro de lá uma cópia da reportagem veiculada na Itália que informava como um engenheiro ajudou os médicos de seu país ao adaptar uma máscara de mergulho para aplicação hospitalar. Como tenho três pessoas na família com sérios problemas respiratórios, minha preocupação é particularmente maior com essa falta de possibilidades de atendimento pelos hospitais. Por trabalhar com EPRs, decidi buscar no mercado máscaras - reconhecidamente seguras - que permitissem essa adaptação, entre as que utilizamos em indústrias químicas, farmacêuticas e petroquímicas e por bombeiros, para que elas pudessem ser aplicadas no tratamento de oxigenoterapia não invasiva, com pressão positiva em pacientes de Covid-19. E os resultados foram positivos”, informa o engenheiro.
“Como existem vários modelos e marcas de máscaras já aprovados e certificados por vários organismos governamentais nacionais e internacionais, separei aquelas que fossem mais confortáveis, considerando que o paciente não passará horas, mas dias com uma delas no rosto. Outro critério foi um modelo que tivesse uma boa vedação, pois os rostos têm anatomias muito distintas. O terceiro diferencial foi a maior resistência aos procedimentos de higienização e desinfecção”, comenta Marco Aurélio. Assim, chegou a três modelos de rosto inteiro (full face) e uma semifacial.
Uma delas já foi aprovada em sofisticado equipamento nos testes respiratório e de vedação/estanqueidade (vazamento). O equipamento, chamado de “bancada PosiChek3”, conta com um pulmão mecânico que respira (inalando e exalando) na máscara, simulando o uso por um usuário. “É um dos equipamentos que tenho em minha oficina para testar os EPRs de bombeiros, que precisam estar 100% seguros e prontos para o uso. Este teste está em conformidade com a exigente norma americana da National Fire Protection Association (NFPA)”, garante. Essa máscara já foi encaminhada para aprovação pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).
Marco Aurélio explica que em todas as montagens foram integrados à máscara equipamentos de uso médico-hospitalar adquiridos no mercado, como traqueias, conectores para fornecimento de oxigênio, filtros HMEF - que filtram até 99,99% de vírus e bactérias - e a Válvula de Ajuste de Pressão (PEEP), responsável em manter a pressão positiva dentro da peça facial. “Efetuamos o teste de vedação, o que garante que a peça facial está estanque e que o vírus não irá escapar por ela. Preocupei-me em equipar a máscara com os mesmos filtros utilizados nas UTIs dos hospitais, para filtrar e reter 99,99% de vírus e bactérias do ar exalado pelo paciente, não contaminando o pessoal do corpo médico. O teste respiratório mostrou que o fluxo de ar nas peças que adaptamos, tanto na inalação quanto na exalação, está com a mínima restrição possível, proporcionando ao paciente grande volume de ar”, explica o engenheiro.
Pacientes e médicos
A máscara adaptada pode ter até cinco montagens diferentes, das quais quatro são para utilização nos pacientes e, uma delas, para ser usada pelo corpo clínico, que vem sendo muito atingido por falta de proteção adequada. De acordo com o engenheiro, a máscara facial inteira (full face), por exemplo, possibilita efetuar o tratamento no paciente com pressão positiva aumentada. Com a pressão ampliada, aumenta também o alcance do oxigênio nos alvéolos inflamados do paciente, visando a melhorar a superfície pulmonar para a troca gasosa, o que auxilia muito na sua recuperação. Além disso, conforme esclarece Marco Aurélio, “a máscara possui, além do filtro na entrada do ar para o seu interior, outro filtro na exalação do ar pelo paciente, o que evita a contaminação do ambiente hospitalar e, também, de médicos e enfermeiros”.
“Conforme os vários médicos com os quais conversei, se assim que o paciente chegar ao hospital com o início da dificuldade respiratória, ele for colocado em uma máscara que trabalhe com pressão positiva controlada por válvula PEEP - com ar enriquecido por oxigênio e sistema de filtragem tanto na entrada quanto na saída do ar -, existe grande chance de o paciente não ter necessidade de ser entubado”, diz Marco Aurélio.
A patente já foi requerida junto ao Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI) assim como o registro da máscara na Anvisa. “Aguardamos somente a aprovação da Anvisa para que os hospitais possam começar a utilizar as máscaras”, informa.
“Conversei com o fabricante e com o maior distribuidor no Brasil sobre a disponibilidade dessas máscaras para o mercado e o distribuidor. Há disponibilidade imediata de pelo menos 400 máscaras. O problema é o custo, que, com as peças necessárias para a adaptação, chega a cerca de R$ 1.400,00 cada. Mas estamos todos empenhados na redução dos preços e em buscar doações. Foi a Decathlon que doou máscaras de mergulho para a adaptação realizada pelo engenheiro italiano. Empresas do setor ou que possam adquirir essas máscaras e doá-las aos hospitais ajudarão a salvar vidas”, sugere.
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Com mais de 30 anos de experiência em manutenção de EPRs à frente da empresa Bio Sub Centro de Serviços - fundada em 1985, em Campinas - o engenheiro Marco Aurélio Fernandes é certificado e autorizado pelos maiores fabricantes americanos e europeus de EPRs - como Survivair, Sperian, Honeywell, 3M-Scott e Fenzy. Em paralelo, ele está trabalhando junto com três amigos (Nelson, Rafael e André) na construção de um ventilador que, se aprovado em testes, poderá também ser utilizado nos hospitais.
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